Amanhecer no Campeche

Amanhecer no Campeche

sábado, 18 de junho de 2011

"onde os sonhos serão reais..."

É difícil, melhor dizendo, não é fácil conviver com o universo fantasioso de Peixes. Tudo bem, os céticos terão aquele risinho de escárnio que se tornou íntimo nesses tantos anos de vida. Ah, ela é viajandona, ah, é uma criança que não cresceu (literalmente...), ah, ela acredita nessas bobagens, ah, ela insiste em nos fazer crer que o mundo sutil (digamos que os céticos usam esse termo) é importante, ah, somos espelho do outro, ah, quanta bobagem!!!! OK. Hoje, me dirijo a quem entende esse tipo de universo. Sabe quando se vive uma ilusão por mais de 30 anos? Não a ilusão do mundo cotidiano de que nos fala os hindus. Não. Uma ilusão criada e alimentada durante mais de 30 anos enquanto a vida escorre, enquanto a vida é vivida. Não é aquela de parar, se alimentar e virar poste. Não. Aquela que é como um mundo paralelo. Coexiste. Sabe o que é juntar os pauzinhos e acreditar que aquilo em que se acredita, mesmo sendo uma projeção dos seus sonhos mais irrealistas (existe sonho que seja realista?) pode se tornar realidade? Sabe o que é estudar uma língua prá talvez, quem sabe, um dia, em uma viagem hipotética compartilhar o conhecimento dela com aquele ser que você acredita entender? Sabe aquela música do Caetano (deuses!, durante anos não conseguia falar com ele quando nos encontrávamos, por puro êxtase que me petrificava: Caetano!... Queria me esconder, mas não precisava. Tenho essa capacidade, me escondo quando quero e ninguém me encontra. Pois é. Queria me cobrir com um lençois compridos prá ele não se dar conta de que eu estava ali. Pode timidez maior?!!!) A música do Caetano dizia que a pessoa amada era capaz de lhe explicar mas não o entendia nada. Na minha cabeça, explico um monte de gente e de situações. Entender? Sei lá. Como é que as religiões explicam o merecimento? Como é que é essa história de programar tudo antes da reencarnação, encarnar, esquecer tudo que programou e lidar com as dificuldades sem nem ao menos saber que objetivo existia antes do encarne? Fico pensando se não há alguma coisa meio troncha nessa equação... Ihhh, devo ficar receosa desse tipo de pensamento? Merecimento. Que é que é isso? Se mereço estar viva, mereço viver, é óbvio. Se mereço viver, mereço ser feliz, já que viver e ser feliz são sinônimos. São? Será que o planeta Terra, esse belo e amado planeta é mesmo um vale de lágrimas? Ah, não, odeio esse pensamento. Detesto pensar que tudo não passa de engano e aquilo que pensamos que é, é exatamente o oposto ou outra coisa qualquer. Acredito em universos paralelos. Não tenho nenhuma vivência deles e se tivesse, provavelmente não estaria neste, agora, escrevendo. Talvez estivesse em outro, rodeada de crianças, em um gramado verde, sol de outono, cantando cantigas de roda e vestida como um moça de outro tempo, um vestido estampado de flores pequenas, claro, rodado. Seria morena. Sempre seria morena. Ciganos são morenos, pessoas intensas, também. Aos louros, os louros do poder. Olhos claros é outra história. Seria feliz. Não que não seja. Mas, há buracos. Sempre há. Ou será esta uma crença limitante como tantas outras? Limites limitam o merecimento. Merecer. Ser digno de. Conseguir em virtude de seus méritos. Isso é o que diz o Aurélio, marido da minha prima Marina. Conseguir em virtude de seus méritos. Pois é. Fica a idéia de crime e castigo, virtude e prêmio. Será que é isso mesmo? Será que é assim, tem que assim ser? Mereço ser feliz por ter sido bondosa, caridosa, fiel? E se a ânsia com que vivo for insuficiente prá que um só homem a satisfaça? Preciso reprimir a ânsia para merecer? O que? Um prazer mediano? O que é ser feliz? O que é merecer? Diante de que formas-pensamentos estamos submissos? E a ânsia do absoluto? Nem beleza, nem carros, nem botox, nem bunda firme, nem prêmios, nem orgasmos múltiplos, nem cornucópias generosas satisfazem essa ânsia. É o que eu digo, não é fácil conviver com o universo fantasioso de Peixes. As equações não se resolvem apesar do tempo e dos cursos em que me matriculo.
Hoje, brindo a uma pessoa com quem convivi, sem muita intimidade, há muitos anos atrás e a quem admirava sem paixão. Por algum motivo, ela está na minha vida até hoje, como na de muitos outros e embala meu trabalho, meu imaginário, minhas entranhas. Por algum motivo, não pude compartilhar de uma comemoração coletiva. Por algum motivo, ela me apareceu na tela da minha tv, de repente, me causando perguntas. Nenhuma resposta.
Parabéns, garoto! Que os deuses te mantenham lindo, discreto, atento e equilibrado e as deusas não se enciumem da tua genialidade e te queiram só prá elas. Al hamdullilah!

sexta-feira, 17 de junho de 2011

"chegando antes de te conhecer"

Fico pensando nos jovens e nos nem tão jovens assim de hoje em dia. Estão todos "surpreendendo o sol, antes do sol raiar, saltando noites sem se refazer" tal a correria que o neo-liberalismo assassino exige. É brutal o que vem acontecendo no planeta, é esmagadora a pressão. Até hoje, com todo o avanço tecnológico, continuamos selvagens, bárbaros, desconectados com o que há de mais verdadeiro em nós mesmos. À medida que envelheço, fato muito difícil de aceitar, não só por vaidade, por disponibilidade, mesmo, percebo os ganhos que as milhares de horas vida me deram. Um deles é o amor. Pois é, sei que é quase impossível (insisto no quase, já que "impossível" como "para sempre" são sempre por um triz, como sabemos todos), então, torna-se quase impossível, nessas alturas da trilha, viver uma nova paixão, aquela que nos deixa sorrindo bestamente só de lembrar que o outro existe, de um instante qualquer compartilhado, aquela que faz o coração disparar, os músculos tremerem, o suor escorrer, que nos impulsiona à ousadia, a embonecar a alma e o corpo, que tira o sono, acelera a respiração, faz o sangue correr feito o Amazonas em seu encontro com o mar.  Relembro as que vivi, não foram poucas, coração vagabundo que me coube, e colho outro tipo de sentimento. Gostaria de ter a precisão, a sensibilidade e a genialidade de uma Clarice Lispector prá destilar gota a gota o que acontece. É tão sutil e tão precioso que nem sempre é percebido, nem sempre se deixa vivenciar. Atordoa sem desequilibrar, preenche sem suor, cura sem arder, escorre feito seda na pele interna do coração, morninho, suave. Foram precisos muitos anos prá construir esse sentimento. Muito encontrão, espadas tilintando, palavras, palavras, deuses!, quantas palavras foram ditas, escritas, lidas, trocadas, em voz alta, em tom baixo, às vezes, aos berros, quantas decisões, idas e vindas, distâncias, dores, lágrimas, champagne, jardins, risos, regados todos os senões e sinais de mais pela necessidade suprema de ser de verdade, de ser prá valer, não um truque qualquer. Não é a bela bunda, os seios turbinados, a barriga de tanquinho, os botox, lábios inchados, pele esticada, a mentira da juventude eterna a qualquer preço que vão trazer o sentimento que descrevo. Não são os títulos conquistados, as batalhas ganhas, o carro novo, a fama, nem o status que o trazem. Tampouco as perdas. Não é o que está fora, o que atraiu ou acendeu o fogo. É o jogo das pedrinhas, talvez, o escravo de Jó jogando caxangá, num tira e bota diário, a canção sutil da conquista sem esforço e ao mesmo tempo com muito, muito investimento na qualidade verdadeira do que se busca, do que se quer, do que se precisa. Atenção às necessidades da alma, da própria alma, que a fonte nela está. É no próprio coração que mora o amor, é na própria morada e é atentando prá ele, prá mim, prá dentro, que surge o imponderável, o que não tem peso, nem juízo, nem limites, nem idade, nem destino, nada. O nada preenchido dessa carícia leve e inesquecível, desse sopro possível, possível, possível entre almas que se amam! Um ponto de luz.